terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Discurso de formatura, 1971. Colégio Estadual de Dom Cavati, MG

Sob a influência das emoções que se mesclam em nossos semblantes, volto a viver um sentimento tão inexplicável, como somente uma vez na vida vivi. Foi quando, um tanto desconfiado, ingênuo e assustado,  galguei pela primeira vez as escadas deste estabelecimento.

Quando o vi pela primeira vez, jamais pensei que um dia fosse representar tanto para mim; jamais cogitei na grandiosa função que ele desempenha; jamais cuidei que me custaria tanto deixá-lo. Sim, deixá-lo ... Esta palavra não chega a aflorar aos meus lábios como quem vive este momento, senão como quem tem a obrigação de, neste instante, dirigir-vos uma mensagem.

Custa-me crer que tenho que sacrificar o sentimento à necessidade, pois necessário é que partamos. Na verdade não sei o que sinto. Se  pre-nostalgia de uma quadra que tão marcante ficou em nossas vidas, se a alegria de ter coroado com êxito parte da empreitada a que nos dedicamos... só sei que sinto. Sinto algo intangível, estranho, e que faz vibrar profundamente as cordas do meu coração. Sim. Todos sentimos, e a maneira mais sublime de evidenciar esta minha afirmação genérica é a sublime expressão do silêncio que paira neste instante sobre os vossos espíritos.

Mas, afinal, o que é a vida? Não é uma sucessão de momentos alegres e de intempéries, de sorrisos e de lágrimas, de sofrimentos e prazeres? E, além disso, não tem mais do que duas portas: uma de entrada, outra de saída. Ninguém, sendo designado para que entre, poderá adiar o momento; do mesmo jeito que, em se chegando a ora da saída, poderá evadir-se pelos fundos. 

Sobra-nos um estreito lapso de tempo entre essas duas portas, e isto é o que chamamos de vida. Resta-nos saber viver para não desperdiçarmos esse tempo precioso que nos legou o criador do Universo. Viver, não como um ocioso, um covarde, um frívolo, ou como vive grande parte da Humanidade; mas, como deve viver um ser feito à imagem e semelhança de Deus. Viver para a glória de quem nos criou, desenvolvendo nossa inteligência para completar nossa criação.

Viver, ainda, para deixar na Terra a nossa marca, e ela não ficará aqui somente com as nossa fisionomias fugitivas, nossa malfadada filáucia (como nos diz Rui Barbosa), mas com as lágrimas que aqui deixarmos, com nosso exemplo de trabalho, de fé, confiança, lealdade, exemplo de gente, não de fantoche! Quem disser o contrário; quem zombar dos que assim fazem, deixemo-lo zombar até que um dia, frustrado no mesquinho ritmo de vida que levou, se reconheça responsável pelo fracasso da própria vida. Aqui é isto que temos aprendido: aprendido a viver, aprendido como se vive para não nos constituirmos mais uma carga para a Humanidade, mais um explorador de incautos, um miserável a mais para retardar o desenvolvimento dessa sequiosa nação brasileira.

Se observarmos os semblantes, um tanto gastos pelo labor, de nossos queridos mestres, encontraremos neles uma sublime expressão de heroísmo, de estoicismo - não intransigência -,  de confiança, como quem se desincumbiu de uma tarefa mui árdua. Não podemos negar-lhes esses valores: são, na realidade, heróis do ensino. Dedicaram-se à essa nobre missão, nem sempre pela remuneração, mas pelo prazer de formar cidadãos competentes e honestos, muitas vezes sem serem reconhecidos pelo seu trabalho.

O que temos a dizer-vos,  mestres,  é que saberemos lutar até o fim para conseguirmos um lugar ao sol,  para sermos úteis à nação que tão graciosamente nos prepara, porque não nos pertencemos inteiramente. Temos um débito para com o povo brasileiro, para convosco. No entanto, se a nossa sorte não nos interessar, interessar-nos-á a sorte da nossa Pátria, porque o que somos ou o que temos devemos a ela.

Obrigado mestres, obrigado funcionários deste estabelecimento, obrigado a todos vós que vos dignastes a colaborar com esta grandiosa missão.

Obrigado senhores pais, porque jamais medistes sacrifícios para nos legar este bem que é o saber. Obrigado porque, embora não tivésseis, alguns de vós, a oportunidade que nos destes, não vos baseastes em sofismas, tais como: não sei, para que ensiná-los? Obrigado por terdes compreendido que vossos filhos precisavam se libertar da pressão deste tirano analfabetismo. Digo-vos que não tereis por que arrependerdes. Saberemos usar estes anos que aqui passamos fazendo deles a mola propulsora de grandes realizações. Saberemos ser, saberemos querer, saberemos conseguir!

Adeus colegas, ide com Deus.
Pais, suplicai por vossos filhos, continuai lutando por eles e os vereis, orgulho de vossa velhice, homens de bem, homens honrados.

Adeus ...

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